BERLINDA ISONÔMICA


Assistindo à “tragédia chuvosa” que, nesta semana, acomete o Rio de Janeiro, é relevante, preliminarmente, fixar um ponto de partida argumentativo: terremotos, maremotos, furacões, nevascas chuvas torrenciais, deslizamentos de encostas montanhosas etc. são dados da natureza. A transformação desses fatos em tragédias provém da ação e da omissão humana. Dito isso, entre todas as possibilidades cognitivas, impõe-se compreender essas tragédias também da uma perspectiva política.

Com efeito, até uma semana atrás, a chuvarada colhia vítimas difusas em diversos estados brasileiros, com prejuízos materiais e perdas de vidas humanas, sem distinção significativa. Disso se aproveitavam os donos do poder federal e seus asseclas na imprensa genuflexa voluntária, travestida de isenta, para promoverem “notícias” e uma “disputa” política, sobre a culpa dos governos anteriores e atual, pelas catástrofes, exclusivamente no estado de São Paulo. Por mais que vítimas também houvesse noutros estados, não lhes preocupava. Bastava-lhes fixar a pecha politicamente negativa nos partidos excluídos do poder federal, precipuamente no que governa os paulistas.

Todavia, nesta semana, infelizmente para milhares de pessoas e famílias, na região serrana do Rio de Janeiro, a “tragédia chuvosa” afogou vítimas, de forma sem precedentes no Brasil. Cada notícia na TV, nos jornais, no rádio, na internet, de TV... cada depoimento, lágrima incontida de um pai, de uma mãe, de um filho, de uma filha, de uma esposa, de um esposo... vertendo que perdeu tudo, sem passado, presente ou futuro, é uma cicatriz na alma.

Então, como sói, os donos do poder federal, pautando os acólitos na imprensa ajoelhada espontaneamente, disfarçada de isenção, propagandeiam todas as providências que estão sendo tomadas para “ajudar” as vítimas dessa “tragédia chuvosa”, sobretudo no Rio de Janeiro e em São Paulo: liberação de milhões de reais por medida provisória, provisão de toneladas de alimentos e medicamentos; ordem de atuação às Forças Armadas e à “Força Nacional de Segurança”, é determinação. Necessárias, sim, no entanto, é de se indagar: quando todas essas providências serão realmente concretizadas?

Pondere-se, ainda, principalmente sobre o tratamento dispensando à tragédia no Rio de Janeiro e as, sem comparação, ocorrências em São Paulo. A magnitude da tragédia no Rio de Janeiro tem comparação com o que sucede em São Paulo? As causas e efeitos são idênticos? Evidentemente que não. Logo, por que ambos os estados são, ordinariamente, referidos como destinatários de iguais medidas assistenciais do governo federal, especialmente financeiras?

Observa-se que, na realpolitik dos donos do poder federal, inserir a “tragédia chuvosa” no Rio de Janeiro e as ocorrências em São Paulo nas mesmas providências, principalmente “liberação de recursos financeiros”, consubstancia uma maneira de igualar suas causas e efeitos, bem como a magnitude desses eventos. Ressaltando-se, ademais, o suposto desempenho significativo e isonômico do governo federal, que, “embora não tenha culpa” pelo que acontece nesses estados, cuida das vítimas, independentemente da coloração política do governo estadual. Providencial, não?

Enfim, nesta realpolitik, diante os efeitos políticos negativos, por ora, da “tragédia chuvosa” no Rio de Janeiro, que poderiam advir para os donos do poder federal e para seus parceiros políticos naquele estado, divide-se com São Paulo e seu governo a mesma berlinda política. “Do limão faz-se uma limonada”.


(Leia aqui: BRASILEIRO CORDIAL)

Comentários

  1. Primeiramente, belíssimo texto, parabéns! É o resumo de uma tentativa de aproveitamento político frente às chuvas que castigaram São Paulo e Rio de Janeiro mas os efeitos, nefastos e mortais, foram inequivocadamente maiores no estado fluminente.
    Principalmente àqueles que são chamandos de "blogueiros progressistas", diante da mortes e danos na região serrana, não conseguiam encontrar pararelo em São Paulo e, assim, começaram a atacar a chuva e os meios de comunicação.
    Sim, pois a infraestrutura, defesa civil e o governo do Estado, responsável por, ao menos, minimizar os efeitos da tragédia, evitado as mortes, não foram sequem citados.
    É mais fácil levar a disputa para o eixo São Paulo, baluarte à resistente petista, do que verificar que o pai dos pobres e a mãe do PAC nada fizeram, e todos os desdobramentos, tais como o comentário da ONU "Brasil não é Bangladesh" e estudos prevendo deslizamentos mostram que a tragédia era anunciada.
    Mas só agora, com mais de 600 mortos é que temos manchantes, um governador em pânico e uma presidente repousando o final de semana na sua cidade natal, enquanto a sociedade se mobilizada para ajudar os desabrigados, fazendo às vezes do Estado.
    Que cada um assuma o que é seu. E que a sociedade se indigne com mais essa tragédia.

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  2. Parabéns pelo texto. Mostra a verdade pura e nua, nem sempre o que alguns querem ouvir, mas o que é importante dizer.

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  3. Belo texto meu pensador. O que mais causa indignação é ver toda essa tragédia ser tratada como causada por "fenômeno natural imprevisível". Remontar causas e motivos a "decadas de descaso" é no mínimo culpar Cabral (o Pedro e não o Sérgio) por tudo.

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  4. Maria Henriques16/01/11, 14:12

    Gostei muito do que li e daqui envio o meu enorme abraço a todos o Brazil que agora sofre. Muito respeito e muito amor para Todos.

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  5. Assim caminham os brasileiros para o abatedouro chamado estado.

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  6. Nossos políticos são eficientes na distribuição de verbas apenas para aumentar seus salários, para o malfadado fundo partidário, para suas vantagens pessoais dadas pelos cargos e para suas emendas. Quanto ao bem estar da população, bom, se restar dinheiro eles pensam a respeito.
    Lembra do alagamento monstro do Jardim Romano, em Sampa, no verão passado? Este ano o flagelo não se repetiu. Por que? Porque obras foram feita no decorrer de um ano. Lembra-se dos desmoronamentos na Serra de Itaipava em todos os verões passados? pois bem, esses continuarão por mais alguns verões.

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  7. Vou copiar aqui o que postou no Twitter a @rrlrenata. Na Austrália com 80% do pais ilhado por quase 15 metros de água de chuva, eles contam com apenas 20 mortos..Salvaram até os cangurus...

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  8. Meu caro, sua análise foi precisa. Apenas fico pensando na realpolitik da Era das Trevas: a que ponto chegamos? Onde vamos parar?

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  9. Duas palavras: CORRUPÇÃO MATA.

    Essas chuvas são nosso 11 de setembro. Precisam dar início a uma guerra contra a corrupção que mata gente às centenas.

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  10. Perfeito! Vamos confirmar isso com dados? Gedel Vieira Lima, ministro da Integração Nacional desde o início do 2º mandato do Lula, era pré-candidato ao governo da sua Bahia e destinou a Salvador (BA) 15vezes mais recursos que a todos os municípios do estado de São Pulo juntos; os 137 municípios baianos receberam verbas semelhantes às destinadas a 620 outros municípios de todo o Brasil. Angra dos Reis (RJ), apesar daquela condição que se apresentou no início de 2010, não recebeu um centavo. Tudo isso sob a coordenação da então forte ministra-chefe da Casa Civil e hoje presidente da República, Dilma Rousseff

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  11. Ontem o nanico PHA (bofe de elite) passou 3 minutos falando do RJ e depois uns 30 falando de SP, visitando os locais alagados e atribuindo a culpa do alagamento a um dique que os tucanos construíram.

    Botou o pé na lama para garantir seus trocados.

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  12. O dinheiro será liberado quando?

    Perguntem pros desabrigados de Santa Catarina no ano passado. Para os de Angra. Para os do Nordeste.

    Sabe quando vão ver a cor do dinheiro? NUNCA!

    Um dia o brasileiro vai aprender que propaganda é diferente de realização. Vai aprender que uma foto de um prato de comida não mata fome, que um cartaz de segurança não prende bandido e que uma placa de obra de hospital não cura ninguém.

    Oremos que seja logo!

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