CAI A NOITE
Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta.
Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa,
Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado.
Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina. O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado. Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada. Preparei minha máquina de novo.
Estava carregando o bêbado. Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada. Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado. Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão.
Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre. Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakoviski – seu criador.
Foi difícil fotografar o sobre. Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakoviski – seu criador.
Fotografei a nuvem de calça e o poeta. Nenhum outro poeta no mundo faria uma roupa
Mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.
Mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.
(Manoel de Barros)
Que linda poesia,Rê!
ResponderEliminarAmei! Acho que vou copiá-la tb;
o nome do inspirado autor está aí; só falta o nome da própria!é mesmo "Fotografei o silêncio"?
Bjocas p/ vc!
Que idéia sublime. Quantos de nós já não brincaram com o silêncio...
ResponderEliminarEsse texto levou-me muito longe, quando eu caminhava lá nas madrugadas de Belo Horizonte. Havia naqueles silêncios um cheiro que me encantava: a dama-da-noite! E eu seguia pelas ruas, sustentado pelos silêncios noturnos e embriagado do cheiro dessa flor que se espalhava pelas ruas...
Bom demais, sô!