É DOMINGO - A LEITURA DETERMINA A ESCRITA


Ao lermos um autor, não temos a capacidade de adquirir as suas eventuais qualidades, como o poder de convencimento, a riqueza de imagens, o dom da comparação, a ousadia, ou o amargor, ou a concisão, ou a graça, ou a leveza da expressão, ou o espírito arguto, contrastes surpreendentes, laconismo, ingenuidade e outras semelhantes. No entanto, podemos evocar em nós mesmos tais qualidades, tornarmo-nos conscientes da sua existência, caso já tenhamos alguma predisposição para elas, ou seja, caso as tenhamos potentia; podemos ver o que é possível fazer com elas, podemos sentir-nos confirmados na nossa tendência, ou melhor, encorajados a empregar tais qualidades; com base em exemplos, podemos julgar o efeito da sua aplicação e assim aprender o seu uso correcto; somente então as possuímos também ato. 
Esta é, portanto, a única maneira na qual a leitura nos torna aptos para escrever, na medida em que nos ensina o uso que podemos fazer dos nossos próprios dons naturais; portanto, pressupondo sempre a existência destes. Por outro lado, sem esses dons, não aprendemos nada com a leitura, excepto a maneira fria e morta, e tornamo-nos imitadores banais.

Arthur Schopenhauer, in 'Da Leitura e dos Livros'
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DISSIMULAÇÃO DA IDENTIDADE

Comentários

  1. Sem pretensão de ser original, afirmo que ler e escrever são incompatíveis com a ignorância.
    Citação perfeita.

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    1. Para escrever, basta pensar. Para pensar, há que ler E interpretar. Passar a vista pelas palavras sem interpretá-las é inútil. Interpretação de texto também é incompatível com a ignorância. E faz-se um ciclo.

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