UMA TARDE CARIOCA


Sábado de sol, 16hs. O porteiro do meu prédio faz os últimos ajustes de luzeszinha de natal no jardim do prédio quando ouve um "ploft" e dá de cara com uma bala de pistola 4.5 que batera no mármore do prédio e caíra a um palmo dele.

Neste mesmo momento, em minha janela, no sétimo andar, passarinhos cantam. Na da minha vizinha, dois andares acima a "visita" é menos romântica. Ela coleciona balas de fuzil e pistolas que pelo menos duas vezes por mês "amanhecem" lá.

O prédio tem 36 apartamentos. Em oito houve casos de dengue em 2009, um deles fatal. Nem eu nem meu filho tivemos a doença.

Três edificações abaixo, pessoas na padaria fazem churrasco na calçada e enfeites de bolas e som alto vindo de um carro demonstram que é uma comemoração. Minha rua, por ser ladeira, não enche quando chove. Em compensação três a minha volta, inclusive a avenida principal do bairro, alagam a cada chuva forte.  Em uma delas, em frente a um hotel três estrelas, semana sim, semana não, um bueiro da Cedae (companhia de abastecimento de água e esgoto) vaza esgoto.

E assim é a vida na "muy hermosa cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro". Aqui você tem que ter sorte! Sorte para não pegar dengue, sorte para não receber bala perdida, sorte por não morar em rua que alaga e tampouco perto de estabelecimentos que não respeitam a legislação e são frequentados por pessoas que não sabem o que urbanidade significa.

Sim, você precisa de sorte, por que o poder público parece inexistente. Aqui lei e ordem só na televisão a cabo ou nos discursos dos governantes.Discursos estes que por ignorância, falta de cidadania , interesse próprios ou tudo isto junto, muitos aplaudem.

E a mim só resta torcer para que um dia o carioca aprenda que quem ama protege e luta pela cidade amada.   

Mirtes Guimarães, jornalista. Uma carioca que nasceu em Minas, por acaso.

Comentários

  1. Márcia,maninha, seu texto é mto bom! Mto gostoso de ler,apesar do tema ser bem doloroso...

    Realmente deve ser mto duro morar em algum lugar inseguro...
    Veja meu caso: moro numa praia do litoral norte, meio afastado do centro, mas onde os assaltos à mão armada têm sido alarmantes!

    Daí a gente se pega a pensar: fazer o que?
    Está certo que só pela educação vamos conseguir ser um pouco mais civilizados, mas ...quando?
    Qto tempo será que falta p/ usufruirmos deste mundo tão desejado,mas que nos parece tão longíquo?

    Gostaria de ler mais textos seus! Sou fã de carteirinha deles!

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  2. Meu pai diria, se fosse vivo, que dessa dor de barriga eu não morreria. Ver o Rio amado, bem cuidado, seguro, passa tão longe dos meus sonhos mais comuns que já nem penso nisso. Continuo na batalha, sem desanimar, mas consciente de que eu, na minha encarnação, não verei nada mehor.

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  3. Viuvamashonesta11/12/10, 23:27

    Para de reclamar da vida, mulher! Poderia ser pior, vc poderia estar morando na Suiça.

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  4. Jorge Atakardiac15/12/10, 23:13

    É muito certo isso de ter sorte para viver bem no Rio. Li sua pensata logo depois de dar uma caminhada até o Posto 9 ouvindo FM tranquilo as 10 da noite.

    Li de uma vez só e foi um belo sacode. Lembrei do período no Meier e comecei a pensar que tinha algo a dizer também. Acabei tomando fôlego e mandei algo sobre zona sul x zona norte que conheço.


    Tem tudo para ser cidade maravilhosa, mas vc está certa, Z.Norte e Sul tem que andar mais juntos nan hora de pensar a cidade e como sair dessa espiral de violencia. A pouco na Maré o couro tava comendo. O twitter é democrático e pode ajudar muito a desenvolver esse debate.

    A gente consegue. Abração.

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